terça-feira, 1 de abril de 2014

A Revolução dos Cretinos Part I - O Golpe



O Golpe de 1964 revestido de intervenções da CIA, trogloditas fardados e civis traidores

    Por Antonio Siqueira



A revolução dos canalhas
     


















     Eu ainda não havia nascido nos dias 31 de Março e 1º de Abril de 1964. Sou de 1968, nasci no outubro negro, exatamente nos dias que precederam o plano macabro do Brigadeiro João Paulo Burnier. Ele pretendia explodir o gasômetro no Centro do Rio de Janeiro no horário do Rush para jogar a culpa nos comunistas, graças ao saudoso capitão Sergio, as coisas tomaram outro rumo. Não foi fácil nascer nesta atmosfera de terrorismo de estado, como não foi menos tranquilo viver a infância sob o crivo dos pavões generais nos anos 1970. O que me atrevo escrever nestas linhas tristes é, muito mais do que pesquisado em livros, muito além dos “contadores de histórias mirabolantes”: É o que ouvi pessoalmente de familiares que viveram esses eventos, alguns até personagens ocultos de certa importância, cidadãos, pessoas comuns e massacradas por esta era de tirania, desrespeito e violência sangrenta contra a sociedade civil brasileira. Fora o emburrecimento coletivo e o empobrecimento estético que os militares hidrófobos nos deixaram como legado infame.


      Muitos insistem ter sido ontem a passagem dos 50 anos do golpe de 1964, data em que o general Olympio Mourão, com suas tropas nem tão numerosas assim, começou a descer a serra de Petrópolis, saindo de Juiz de Fora e chegando ao Rio para depor o presidente João Goulart. Para outros, o dia certo foi 1º de abril, quando contingentes bem maiores do Exército deixaram os quartéis da Vila Militar para enfrentar os rebeldes e, diante deles,  sem disparar um tiro, decidiram aderir e transformaram o movimento num desfile militar logo apoiado por contingentes de São Paulo, Pernambuco e, ao final, Rio Grande do Sul. Os golpes dentro do golpe começaram naquele dia, pois se era uma ação pérfida e vitoriosa, daquelas comuns na História, parecia natural que o general comandante da rebelião assumisse o poder, diante da fuga do presidente constitucional. Convenhamos que o Golpe mesmo, começou em 1961, quando a CIA ‘cochichou’ no ouvido do bêbado inveterado, Jânio Quadros, que era hora de dar o fora, ou iriam "suicida-lo". Mas isso é assunto para mais adiante.






A tomada



















        Ledo engano do general Mourão, porque no Rio conspiradores que não tiveram coragem para deflagrar o movimento logo decidiram empalmar o poder. O ministro do Exército, Jair Dantas Ribeiro,  encontrava-se internado no Hospital Central, vítima de enfermidade que logo o levaria desta vida. Diante da confusão, o mais antigo dos generais, Costa e Silva, que naqueles dias comandava uma escrivaninha, sem tropa alguma, num gesto de audácia ocupa o gabinete do ministro e declara-se chefe do movimento revolucionário. Havia conspirado, é claro, mas como muitos outros. Diante do fato consumado e com o apoio da Marinha e da Aeronáutica, intitulam-se Comando Supremo da Revolução e assumem o poder. Outros generais, como Castello Branco, Cordeiro de Farias, Juarez Távora, Ernesto Geisel e Golbery do Couto Silva discordam, mas nada podem fazer, pois também careciam de tropa. A primeira iniciativa seria conter Mourão Filho, já às portas do Rio, na Avenida Brasil.



       Determinam, e ele aceita, que em vez de prosseguir e tomar a sede do ministério do Exército, na Central do Brasil, rumasse com seus soldados para o estádio do Maracanã, onde receberiam alimentação e hospedagem. Ele aceita, ficando depois satisfeito com a oferta de que seria nomeado presidente da Petrobrás. Nem isso foi, limitando-se a dizer que não era político, mas “uma vaca fardada”. Costa e Silva detinha o poder e pretendia mantê-lo, apesar da resistência de Castello Branco e outros generais ditos intelectualizados, mas coube a ele convocar o jurista Francisco Campos, autor da Constituição fascista de 1937, para que editasse um ato revolucionário capaz de suplantar a Constituição vigente de 1946, “legalizando” o golpe.



A  Marcha da Família com Deus e o Diabo na Terra dos Canalhas












     
   

     Nas ruas, mulheres, empresários, padres, estudantes de direita, empunharam rosários e bandeirinhas do Brasil na mão, sob o lema “Família que reza unida, permanece unida”, realizaram entre 19 de março a 8 de junho de 1964, 49 marchas pelo país. As marchas antes do golpe militar de 31 de março, eram chamadas de Marchas da Família com Deus, depois do golpe passaram a chamar Marcha da Vitória.

     Com exceção do jornal Última Hora, todos os grandes jornais do país apoiaram o golpe militar. Quando consumado a queda do governo, somente o movimento estudantil, alguns sindicatos, alguma tropa do Rio Grande do Sul, pequenos setores da ala esquerda das forças armadas e os partidos comunistas clandestinos, rebelaram-se contra o golpe. O restante da nação aplaudiu e agradeceu aos militares por salvá-los do perigo vermelho. Desde os tempos áureos do Macartismo, uma campanha feroz de caça aos comunistas norte-americana, criada e liderada pelo Senador Joseph Raymond McCarthy, em terras brasileiras, cria-se no folclore de que comunistas eram canibais e comiam crianças por algum motivo obscuramente macabro que os meus avós não conseguiram me explicar.




Mulheres que Marcharam a Favor do Golpe Militar

     A Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu 1 milhão de pessoas na Candelária, Rio de Janeiro, no dia 2 de abril de 1964, recebeu os militares vindos de Minas Gerais, como heróis e salvadores. Esta marcha, que se passou a chamar a Marcha da Vitória, chancelou o golpe militar. Era a representação da família, da igreja, do povo brasileiro, que no ato se mostrava feliz e grato aos golpistas.
Diante do sucesso das marchas, no dia 13 de maio, pouco mais de um mês após o golpe de estado, aconteceu na sede dos Diários Associados, na rua 7 de Abril, no centro de São Paulo, uma cerimônia empreendida por Assis Chateaubriand, que lançava uma campanha nos jornais, rádios e tevês, chamada de Ouro para o Bem do Brasil. A campanha convencia o povo a ajudar o novo governo, com doações de ouro, através de alianças, anéis, pulseiras, colares e outros objetos. O Rotary Club aderiu à campanha, promovendo por várias cidades do Brasil a Semana Cívica do Ouro. O governador Adhemar de Barros doou o seu salário de 400.000 mil cruzeiros. A indústria automobilística doou veículos, empresários contribuíram com cheques, que chegaram a milhões. 100 mil pessoas doaram 400 quilos de ouro e meio bilhão de cruzeiros, em duas semanas. Quem fazia a doação, recebia uma aliança de latão com a inscrição: Doei ouro para o bem do Brasil. O valor real arrecadado jamais foi revelado, tampouco o destino que as joias levaram.

    Das mães que marcharam pelas ruas do Brasil, saudando o golpe militar, ou daquelas que doaram joias para a construção de um Brasil livre do perigo vermelho, muitas foram as que, anos depois, saíram das suas casas à procura dos filhos desaparecidos e mortos, tragados pela repressão militar. Segundo dados estatísticos, a maioria dos jovens que se rebelaram contra a ditadura, era oriunda de uma classe média abastada, que se beneficiara economicamente com o novo regime. Benefício que lhes custaram caro, o arrependimento eterno.


Lacerda, JK e os embrionários da patifaria.

No legends
















     Parlamentares cassados, os que sobraram cumpriram a ordem, mas outro problema surgia: a Constituição determinava que chefes do estado-maior das forças armadas, para candidatar-se a postos eletivos, deveriam desincompatibilizar-se seis meses antes as eleições. Castello ainda era chefe do estado-maior do Exército. Assim, era inelegível. Imediatamente acrescentou-se um artigo ao Ato Institucional: “para as próximas eleições, não haverá incompatibilidades”… Castello Branco seria o primeiro presidente militar e o pé na porta para os próximos 21 anos de Chumbo!

     Estava consolidado o golpe militar, que implantaria uma das mais sangrentas ditaduras da história, e a maior que o Brasil já teve. Estender-se-ia de 1964 a 1985. Os pilares dessa ditadura foram construídos pela ambição de três governadores de estados brasileiros e um ex-presidente: Adhemar de Barros, governador de São Paulo, Magalhães Pinto, governador de Minas Gerais, e Carlos Lacerda, governador do então estado da Guanabara (incorporado ao estado do Rio de Janeiro em 1974) e Juscelino Kubitschek, presidente do país de 1955 à 1960 e criador do monstro chamado Brasília. Ambicionando a presidência da República, quatro homens apoiaram o golpe, desencadeando um clima político no país para que ele fosse executado.

     JK, naturalmente, era figura-chave do PSD. Mantivera postura escorregadia no curso do golpe contra Jango, que fora seu vice (e em seguida de Jânio, até ele próprio assumir, em 1961), proferindo a célebre frase: “Estou onde sempre estive ao lado da liberdade e da democracia”. Conhecia Castello Branco. Mais que isso: por indicação e insistência de um amigo de Castello, Augusto Frederico Schmidt, poeta, intelectual e assessor pessoal de Juscelino quando presidente, fora exatamente JK quem havia promovido, em 1958, o agora marechal a general de divisão.

Um diálogo curto, porém revelador:

– Então, presidente, estou aprovado para a Presidência?

JK respondeu:

– Perfeitamente, general, e com o nosso apoio.

Juscelino cumpriu o compromisso. Os militares, temerosos de sua popularidade, não. Seu mandato de senador seria cassado dois meses depois, a 8 de junho daquele 1964, e os direitos políticos suspensos por 10 anos.

Vendo aproximar-se a degola, o ex-presidente proferiu seu último e enérgico discurso no Senado cinco dias antes, a 3 de junho de 1964.

Alertando que a nação vivia “sob os efeitos do terror” e declarando-se “vítima preferida da sanha liberticida” do regime, disse JK:  “Sinto uma perfeita correlação entre minha ação presidencial e a iníqua perseguição que me estão movendo”. Tarde demais...já havia entrado tudo!



As "Putas Arrependidas" do Golpe Militar

     Carlos Lacerda, em 1939, passou de fervoroso comunista a um inimigo implacável das esquerdas e das causas populares. Conhecido como corvo conspirador, conspirou contra Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart. Sua índole incendiária aspirava à presidência da República. Quando se apercebeu que o governo dos militares não se faria provisório, e manter-se-ia no poder por um longo tempo, rebelou-se, o que resultou nos seus direitos políticos cassados pelo governo militar. Em 1967, Carlos Lacerda, o maior inimigo do governo João Goulart, surpreendentemente, aliou-se ao presidente deposto e a Juscelino Kubitschek, formando a Frente Ampla, para assim, restituir as eleições diretas no país. A Frente Ampla foi sufocada pela repressão do regime. Quando morreu, em 1977, Carlos Lacerda era o maior arrependido dos apoiadores do golpe de estado de 1964.

     Adhemar de Barros, governador de São Paulo, falso puritano, trajava-se de defensor da moral e dos bons costumes, cinicamente incentivava o bordão “Rouba, mas faz”. Também ele ambicionava a presidência do país. Ao sentir-se traído pelos militares, em março de 1966, exigiu a renúncia do presidente Castelo Branco, lançando um manifesto a exigir a restauração da democracia. O manifesto resultou na cassação do seu mandato, tendo os direitos políticos suspensos por 10 anos. Ameaçado de prisão, Adhemar de Barros, um dos maiores apoiadores do golpe de 1964, partiu para o exílio, a 7 de junho de 1966. Morreu em Paris, em 1969, deixando com a amante, a famosa “Caixinha do Adhemar”, um cofre com 2.600.000 dólares dentro, produto do dinheiro público do povo paulista. Este mesmo cofre foi roubado de amante, após a sua morte, por guerrilheiros que resistiam ao regime militar, em 18 de julho de 1969. Estes, meus senhores, são As "Putas Traídas e Arrependidas" do Golpe Militar. Histórias macabras de gente muito sinistra que passou por aqui. Eu volto...





10 comentários:

  1. Um documento histórico postado aqui. Não poderia esperar algo diferente e a abordagem precisa em detrimento aos governadores e ao ex-presidente que apoiaram o golpe, denominados como "putas arrependidas" é perfeita! Eu tive perdas severas neste período.
    Muito obrigada.

    Adalgisa - Osasco - São Paulo

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  2. Formidável!
    A amplitude da verdade aqui, aos meus olhos. Pensei de morrer sem ver alguém dizer que Juscelino era um oportunista dos mais safados que passou por esta terra.

    G.L - Rio de Janeiro

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  3. Também nasci depois do Golpe, 12 anos após esta demonstração de descontrole total do Estado de Direito.
    Hoje não há condições para que se dê um golpe do tipo que depôs João Goulart. Mas isto não quer dizer que os espíritos herdeiros do golpe estejam dormindo. Há sempre que se vigiar. Os chilenos vigiam as forças de segurança e botaram na cadeia a maioria dos colaboradores de Pinochet.
    Excelente artigo, Antonio. que venha a segunda parte!

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  4. COM TODO RESPEITO ÀS FAMÍLIAS DAS VÍTIMAS, ÀS MÃES DOS TERRORISTAS QUE BAGUNSSARAM ESTE PAÍS, MAS NO TEMPO DOS MILITARES HAVIA LEI E RESPEITO, HOJE É UMA BAGUNSSA, CORRUPÇÕES DEMAIS, ASSASSINATOS, ROUBOS NA RUA, TRAFICANTES NAS RUAS. EU TENHO SAUDADE DO TEMPO DOS MILITARES E NÃO TENHO MEDO DE DISER ISSO PARA NINGUEM.

    EDMILSON SILVEIRA

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    1. Respeito sua opinião, a tribuna é livre. gostaria de ouvir isso pessoalmente, como não é possível, aí está seu comentário, prezado Srº Edmilson

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  5. NO TEMPO DO FIGUEIREDO TINHA ESCOLA NO BRASIL E MAIS TRABALHO. VIVEMOS UM VECHAME HOJE EM DIA!

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    1. Srº Edmilson, juras que existiam escolas no tempo do Figueiredo? hehehehehehehehehehehehehehehehehehehehehehehehehehe
      Que tipo de "escola"? Estou vendo que o retrocesso educacional iniciou-se mais cedo do que eu poderia supôr. Não me queira mal, por favor! hehehehehehehehehehehehehehehehehe

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  6. É meu irmão...temos conversado sobre isso há algum tempo com muita gente. De fato a sua fala é deveras pertinente quando relatas a questão da "putaria"...Da primeira (1889) à Nova República (1988), passando pelos 21 anos de obscurantismo em que se viveu nesse tão rico "trópico dos pecados", o que constatou foi, uma especie de complexo de Édipo de Édipo às avessas...triste, como bem narraste, é perceber que a nossa mãe, a quem deveríamos respeitar e amar, nos abandonou e fomos adotados por cafetinas e cafetões, que nos prostituiu e corrompeu. Nossa "república" é uma Puta...simples assim, querido mancebo! Triste ainda a notícia do falecimento de um grande José Wilker nesta manhã de sábado (05/04/2014)! Falaremos amiúde sobre a pauta por ti levantada. Com sua lucidez, ainda temos a esperança de revertermos e elaborarmos melhor psicologicamente o golpe desferido contra a alma dos nossos irmãos e irmãs, ainda não recuperados afetivamente, e, portanto, ainda muito confusos diante de tanta covardia . Salve, Salve!

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  7. Nós temos este direito e dever, caro professor, amigo-irmão e parceiro de ideias; meu professor querido! Bisa, és notável, meu irmão! Estudamos juntos, você escolheu seu caminho, formou-se, mudou sua vida, amou é amado e em nenhum momento perdeu a essência do seu ideal maior. Salve, salve a ti, amado irmão!

    A grande puta terá que mudar, pois foi sucessivamente seviciada, estuprada e encaniçada. Se é preciso derramar sangue para que se obtenha um território ou um mundo justo, que seja derramado o sangue certo!

    Obrigado por sua participação e este espaço ainda é seu...
    portanto E S C R E V A !!!!

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